Por trás de toda grande vitória, sempre haverá uma grande dedicação
Em 1948, ainda quando o mundo superava os vestígios que a Segunda Guerra Mundial deixou, nasceu Otávio Santos, protagonista de uma história marcada por muita luta, trabalho e vitórias.
Natural de Camboriú, teve uma infância difícil. Logo aos 6 anos de idade já tinha que trabalhar e ajudar no sustento da casa.
Seu primeiro emprego foi em uma olaria, onde trabalhou até os 14 anos. Era encarregado de transportar telhas.
Em 1964 houve a famosa divisão de Camboriú, transformando a parte litorânea em Balneário Camboriú, que se beneficiava do grande boom do turismo e do setor imobiliário, e a parte do interior, Camboriú, sofria uma grande queda, praticamente parando no tempo. Para piorar, em 1970 foi inaugurada a BR-101 asfaltada, uma via rápida que deixou a antiga estrada que cortava a cidade e escoava a produção agrícola e de mineração para trás. A cidade se agarrou ao que sobrou, a grande produção da cerâmica de telhas, agricultura e do mármore. A cidade até hoje é conhecida como a “Capital do Mármore”.
Ainda aos 14 anos, Otávio teve sua primeira experiência no mundo do empreendedorismo, junto ao irmão compraram 10 mil paralelepípedos e 800 molas que eram utilizadas para fazer muros. Iriam inicialmente revender, mas não foi como pensaram, não conseguiram comercializar e tiveram que passar o natal sem comprar nada, nem sequer uma camiseta conseguiram comprar. No final jogaram tudo fora, e não se sabe até hoje o paradeiro dos experimentos do primeiro ato de empreendedorismo.
Trabalhava em qualquer coisa que aparecia, como diz a velha expressão, “era pau pra toda obra”, engraxava sapatos na praça da cidade, vendia velas e cocada no cemitério. Nos estudos “tapeou” e fez até o 4º ano, algo que era comum na época, já que as crianças tinham quase como obrigação trabalhar para ajudar no sustento de casa.
Eram épocas difíceis, sofridos, via nos olhos das pessoas o sofrimento, crianças, amigos, adultos, mulheres, todos tinham que trabalhar mais do que o próprio corpo suportava, mesmo assim se orgulha – “tudo que ofereciam eu fazia sem pensar duas vezes, a única coisa que eu não fiz foi roubar”. Lembra Otávio.
Lá por volta dos 15 anos veio realmente a aprender o que era ser sapateiro. Trabalhou para uma empresa do ramo por um ano, sem receber nenhum tostão em troca. Para se sustentar pegava a carroça do pai aos finais de semana, botava nas costas já que os cavalos ele não podia utilizar, e fazia uma volta gigantesca na cidade enchendo-a de couro. Motivo pelo qual atualmente sente dores no corpo, por causa da dificuldade que era carregar todo esse peso, sente dores nos pés e braços de tanto que fez força.
Sua relação com os pais sempre foi muito boa, mesmo que por muitas vezes o pai fosse duro. Mas Otávio não o culpa, eram tempos difíceis. A mãe era muito boa com os filhos, sempre costurava e fazia doces para eles venderem e arrumarem um dinheiro para comprar roupas.
Há até uma história engraçada, o primeiro sapato que Otávio usou foi presente da mãe, que trocou por uma pata, isso mesmo, uma pata em troca do sapato. Mas a história desse sapato não para por aí, ele era de um rapaz que tinha acabado de falecer. Certa vez a mãe de Otávio pediu para ele ir ao cemitério pegar algumas argolas de coroas de flores que tinham caído para vender nos finados, e ele foi com o sapato novo, todo empolgado. Chegando lá foi procurando os arcos sem flores, e encontrou um coveiro que o informou: – “aí está enterrado o rapaz do teu sapato”. Na hora ele já se arrepiou e se apavorou, saiu correndo como se a própria vida estivesse em perigo, quanto mais corria mais o sapato rangia fazendo com que ele achasse que o defunto o perseguia. Sem dúvidas era uma cena digna de filme.
– “Quando ganhei o sapato andava todo faceiro, estava tão alegre que nem me importava com os rangidos dele”. Lembra Otávio.
Realmente os sapatos de antigamente não eram nada confortáveis comparados aos hoje. Eles surgiram a partir de 10 mil a.C, eram usados inicialmente para proteger os pés, e ao longo dos anos foram se modernizando até se tornarem um item essencial de moda e conforto. Tiveram muitas formas, feitos de materiais inusitados como palha, papiro ou fibra de palmeira por exemplo.
Alguns anos se passaram depois da fatídica cena do primeiro sapato e em um momento que não esperava, encontrou o amor da sua vida, Marlete atualmente fazem 52 anos de casados, tiveram três filhos, Natanael, Maristela, Natercio.
Em uma das dezenas de trabalhos em que exerceu, percebeu que seu chefe não dava valor para os funcionários da própria cidade, então decidiu ele mesmo sair e ir buscar emprego em Balneário Camboriú.
Aos 20 anos, recém casado, passava por dificuldades, o patrão não o pagava, então botou na cabeça que não queria mais trabalhar como funcionário e procuraria fazer algo por conta própria.
Iniciou uma sapataria em Itajaí, que se chamava Calçados Santos, onde fabricava somente sapatos sob encomenda. – “Tem até uma história engraçada, eu fui até Blumenau visitar um amigo sapateiro e ele tinha um couro que usava para limpar um pincel bem desgastado, eu falei que levaria para o lixo e jogaria fora, mas acabei trazendo pra casa e inventei o sapato alto pra homens”. Esse mesmo primeiro sapato foi dado de presente para o Dr. Arli, seu advogado da época.
Sua estratégia era simples e certeira, usaria o advogado para fazer o sapato ganhar destaque no meio masculino. Existia um baile no Clube Guarani, em Itajaí, onde pediu para o Dr. Arli ir com o novo par de sapatos para que os outros vissem a novidade, e “estourou”, todos queriam saber da onde veio e quem fez. Foi tanta encomenda na primeira semana que o próprio Otávio não deu conta e teve que pedir ajuda pra um amigo.
18 meses depois da novidade cair no gosto das pessoas, saiu de Itajaí por causa de uma crise familiar, a mulher estava doente, a filha estava doente e o aluguel da sapataria e da casa em que moravam estavam comendo a maior parte dos lucros.
Resolveu então voltar pra Camboriú e morar em uma casinha que possuía. Ali nos fundos da pequena casa deixou alguns pares de sapatos. Foi pra cidade e tentou vender, e por mais inesperado que parecia, vendeu tão bem que pensou em montar uma loja na cidade, percebeu que o mercado necessitava de uma empresa especializada. Foi então que surgiu a Calçados Maristela.
Ele produzia e a mulher vendia, uma luta enorme pra fazer o negócio dar certo e uma incerteza profunda.
No início eram muitas dificuldades, por falta de segurança na cidade a loja foi furtada diversas vezes. Relembra até de um infeliz dia que recebeu uma grande quantidade de mercadoria à tarde, e a noite misteriosamente foram furtados. Fazendo Otávio ficar endividado.
– “Mas eu nunca desisti. Tem que persistir, se não dá hoje, amanhã vai dar”. Afirma Otávio.
Um dos pontos altos da sua carreira foi quando surgiu a oportunidade de fazer um serviço pra atriz Vera Fischer, que na época era candidata a Miss Blumenau. Lembra de levar pessoalmente o primeiro sapato na loja do pai dela, que foi seu cliente por anos.
Durante a trajetória da Calçados Maristela, todos os filhos se envolveram em algum momento no empreendimento junto ao pai, mas no final só Natanael seguiu na matriz.
Natanael Santos nasceu em Itajaí, no dia 17 de junho de 1973.
Sua infância assim como a do pai, foi muito difícil. Teve que logo que ir trabalhar também, com 15 anos inseriu-se em seu primeiro emprego, no Bondinho de Balneário Camboriú, um dos cartões postais da cidade. Este foi seu único trabalho como funcionário.
Logo aos 16 anos demonstrou pela primeira vez o seu lado empreendedor, criando sua primeira empresa, uma lavação de carro. Trabalhou alguns meses nela e em seguida vendeu o negócio.
Certo dia conversando com um amigo, percebeu que tinham um pensamento em comum, queriam ganhar dinheiro e empreender, sem depender de ninguém. Não sabe o motivo, mas decidiram investir junto em uma padaria, onde ficou por mais 2 anos. Isso aos 18 anos.
Casou-se e decidiu entrar no mesmo ramo do pai, em 1996 abriu uma loja de calçados em Balneário Camboriú. Inicialmente pequena, como a maioria dos empreendimentos, mas que aos poucos foi ganhando forma e espaço no mercado.
Como sua vida inteira foi só empreender, deixou a loja de calçados para a esposa tomar conta e entrou no ramo de carros, que era uma das suas paixões, fundando uma oficina.
Mas como nem tudo são flores, aos 29 anos se viu quebrado, em crise, sem um tostão no bolso e seus empreendimentos afundando cada vez mais. Desfez seus negócios e pegou um pouco do estoque de sapatos que sobrou para vender em Camboriú. Sem saber, repetiu inesperadamente a mesma história do próprio pai.
Seu desejo pelo próprio negócio nunca saiu da mente, decidiu comprar um mercado no bairro Rio Pequeno, onde conseguiu levantar capital em dois anos. Vendeu o mercado e voltou para o ramo dos calçados. Agora com uma estrutura melhor e com mais experiência no mundo dos negócios.
Anos depois, seu pai o chamou para ajudar na Calçados Maristela, já que os problemas de saúde começavam a aparecer. Nessa época os três irmãos estavam na loja, posteriormente, a nome irmã mudou para outro ramo, o irmão Natercio ficou com a loja que Natanael tinha criado em Balneário Camboriú, e Natanael assumiu o do empreendimento do pai como sócio.
Em sua jornada, por causa da falta de dinheiro em certos momentos teve até que pedir pra esposa ir almoçar na casa da mãe dela e ele ir pra casa do pai. Mas foi com suor, trabalhando além do expediente, chegou a vender pano de louça. Nunca gostou de depender de ninguém, queria vencer sozinho, e venceu.
A transição da Maristela Maristela já foi concluída, Otávio ainda gosta de estar presente, mas deixa o filho tomar suas próprias decisões e escolhas, confia nele. Por volta de 2003 Otávio teve problemas de saúde e só não fechou a empresa porque Natanael decidiu assumir e não deixar que o esforço de mais de 30 anos se desfizesse.
Em 2006 Natanael teve uma ideia brilhante na Calçados Maristela de ampliar o local onde estavam fixados, transformando-o num prédio empresarial, assim teriam a renda da loja e mais o aluguel das outras 11 salas. Assim não dependeriam tanto das vendas e lucrariam muito mais.
– “O meu pai é uma pessoa que veio do nada, sem estudos, que nunca teve medo de enfrentar os desafios, sempre nos mostrou que precisamos ter coragem”. Completa Natanael.
Certa vez quando estava procurando dar uma olhada nas novidades e no que as outras lojas de sapatos estavam fazendo, visitou um showroom de sapatos, e lá um concorrente comentou com Natanael que iria encerrar as atividades da loja, pois queria se aposentar. Nessa noite Natanael passou em claro pensando nisso e no dia seguinte foi lá fazer uma proposta, pensava em abrir a primeira filial da Calçados Maristela, era a hora certa. Então o negócio foi concretizado.
– “Tomou a direção da loja de seus pais em um período em que a situação não estava muito boa e conseguiu progredir, com visão de negócios ergueu a empresa, não só apenas tirou do vermelho, mas também fez com que crescesse e expandisse. Hoje sem dúvidas é uma empresa sólida e que conquistou o sucesso”. Comenta Carine Silva, cunhada de Natanael.
Agora com mais de 50 anos de experiência, a Calçados Maristela é sinônimo de qualidade. Quando os cidadãos de Camboriú pensam em conforto e moda, certamente é a primeira opção que vem em mente. Lutaram, trabalharam e se esforçaram, agora são recompensados por todo suor que um dia foi derramado.
Hoje Natanael consegue viver tranquilo, sem precisar trabalhar 12, 14 ou mais horas por dia. Consegue dedicar-se a família, mulher e filhos, aliás, foi em 2011 que Natanael se casou com Sunamita.
– “Em 2009, eu trabalhava com turismo e já estava a quase dois anos sem férias, e faltavam alguns dias para elas, então falei com ele (Natanael) que ao pegar as minhas férias, faria uma viagem pro Pantanal ou pro exterior (Santiago – Chile), ele ficou calado. Pouco tempo depois, ele me ligou e disse “vamos para Santiago então!”. Fizemos o roteiro e viajamos em cinco pessoas de carro, passamos pelo Uruguai e Argentina, foram 7500 km rodados entre a ida e volta, pudermos conhecer as três capitais destes países mencionados, além de também conhecer a Cordilheira dos Andes e o Oceano Pacífico, um ano antes do tsunami que atingiu o Chile. Como eu sempre disse, ele é ousado”. Conta Vanderson Alexandre.
Hoje Otávio é um homem realizado, veio do nada para conquistar o mundo, construiu uma família, uma empresa, batalhou e suou, deixou seu legado aos filhos. É feliz e realizado.
Quando fala da esposa, se emociona, nunca brigaram e nunca fez nada sem o apoio dela, resume seus sentimentos ao mais maravilhoso que podem existir.
Se define como um homem alegre, lutou e batalhou. Nunca pegou um centavo de ninguém. O que deixa de legado é ser fiel, seja fiel com sua esposa, filhos, empresa, funcionários e principalmente com Deus.
– “Natanael é um cara que lutou bastante e que venceu”. Feliz, tranquilo e que conquistou tudo que merecia.
– “Sua empresa é de sucesso graças ao seu esforço e luta através da boa administração que ele teve durante os anos a frente da loja Maristela Calçados”. Claudinei Braz, amigo de longa data de Natanael.
Otávio foi a primeira geração, Natanael a segunda, com certeza veremos a terça, quarta e quiçá a quinta. Sem dúvidas se as próximas gerações tiverem metade da garra que esses dois homens possuem, ouviremos falar muito ainda da Calçados Maristela, que merece sim todo o sucesso que possui.
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