Raízes na própria história de Camboriú
A mãe de Alcy Pereira não teve que ir até Itajaí para trazer ao mundo seu filho. Era o inverno de 1941 e não existia algo parecido com uma maternidade em Camboriú (SC). Sorte dela que era um tempo em que as parteiras ajudavam nos partos.
Assim nasceu Alcy Pereira, o popular Kiko, sendo recebido na sua estreia no mundo por uma parteira.
Para quem não sabe, Camboriú recebe seu nome por estar encostada no Rio Camboriú, que significa na língua tupi “rio dos robalos”. Essa é uma das acepções para o nome da cidade. A outra remete ao relevo da Pedra Branca, um morro com formato de seio de mulher. Juntando “cambu”, que significa mamar, com “ruru” que é igual a “riu” e que significa recipiente ou utensílio de mamar, chegaríamos a “Camburiú”, unindo a ação de mamar ao seio da mulher.
Claro que ao nascer Alcy não estava preocupado com essas coisas referentes ao nome da cidade. E nem depois, quiçá.
Ele cresceu numa cidade segura, tranquila, com uma população pequena e muita liberdade. Ele conta que teve uma infância muito feliz, sadia, com muito espaço para se divertir e exercitar sua imaginação.
Alcy brincava com todos os amigos da vizinhança. As brincadeiras eram muitas. Eles tinham pião, estilingue, “zorra” e podiam, quando ficaram maiores, andar a cavalo. A ”zorra” era um carrinho de madeira, uma simples tábua sobre quatro rodas de rolimã, guiado pelas duas rodas dianteiras que eram movimentadas pelos pés. Os meninos desciam as ladeiras levantando poeira, pois não existiam ruas asfaltadas ou calçadas. Seus gritos ecoavam nas paredes das casas baixas da época. Era uma algazarra só.
O pai de Alcy, Andrônico, era um comerciante muito respeitado na cidade e era bastante severo na educação dos filhos, apesar de ter momentos carregados de carinho. A mãe, Maria Ana, era a proteção, o porto seguro para os filhos. Com seu jeito todo especial estava sempre protegendo os filhotes, tentado que não se metessem em problemas nem fosse para o castigo.
Talvez por esse motivo Kiko fosse muito apegado a ela, assim como todos os irmãos. Apesar de tantos anos passados, guarda uma doce lembrança da mãe. Ela era uma mulher muito especial. Kiko lembra, com carinho, que assim que chegava alguma roupa nova na loja do pai, a mãe ia lá e escolhia uma peça para ele. Aquilo era um gesto de amor que ele não esqueceu até hoje.
Deveriam ter sido oito irmãos, mas os três primeiros morreram muito cedo, tão cedo que Alcy nem os conheceu. Às vezes, ele conta, escutava a mãe ou pai se lamentarem pelos primeiros filhos terem ido embora tão cedo.
Essa tragédia familiar fez com que os progenitores tivessem todo o cuidado do mundo com os filhos que vieram depois. Eles se desdobraram para que nada de ruim acontecesse com eles.
Alcy cresceu respeitando muito aos pais, aos professores e aos maiores. Ele sabia que se fosse castigado na escola, receberia o mesmo castigo em casa ou, talvez, até um pouco mais. Eram outros tempos, era outro século. O castigo na sala de aula era uma prática normal. O castigo físico fazia parte da educação e ninguém reclamava. Se aquilo era bom ou não, é outra discussão.
Kiko era muito elétrico na sua infância e adolescência. Tinha um bom relacionamento com os colegas, com os amigos. Porém, confessa, brigava muito na rua. Ele afirma que era outro tipo de briga, não tão perigosa e agressiva como a que hoje se vê entre os jovens e os não tão jovens. Escaramuças na rua ou no colégio era coisa normal para ele e seus amigos, algo que no dia seguinte era esquecido, superado. Ninguém cultivava inimizades por muito tempo.
Os cinco irmãos que sobreviveram se levavam muito bem e se criaram numa cidade calma e que dava condições de viver em paz.
O pai de Alcy, como todo comerciante bem sucedido, tinha uma vaca, um cavalo, uma carroça. Assim o garoto, já lá pelos dez anos de idade, aprendeu a ordenhar e a lidar com cavalos. Quando cresceu um pouco e se sentiu forte, participava de corridas de cavalos. Aos domingos, quando ninguém trabalhava, corria com seu cavalo ou jogava futebol.
Já um pouco maior se mandava para as “domingueiras”, tardes dançantes dos domingos. Aconteciam em bairros diferentes. A voz se corria que em tal lugar seria a domingueira daquela semana e a turma, de todas as idades, corriam para lá. Era o momento para conhecer pessoas, se entrosar, namorar, se divertir.
Lá pelos quinze anos, Alcy já não pensava em estudar. Queria trabalhar e foi numa oficina mecânica que começou sua vida laborar.
Naquela época ele já andava de olho numa vizinha, Ecléa, que era uma senhorita de apenas quatorze anos, um ano a menos que ele. Sem perceber, o garoto sapeca ficou acorrentado para sempre àquela bela menina. Está com ela até hoje e, pelo sorriso que esboça quando fala nela, parece muito satisfeito.
A oficina onde ele arrumou emprego era da empresa de ônibus que fazia a linha entre Camboriú e Itajaí. Os quatro ou cinco veículos da empresa giravam durante o dia e recebia manutenção durante a noite. Alcy conta que, em realidade, foi trabalhar lá porque gostava do macacão que usavam os funcionários. A paixão pelo oficio de mecânico veio depois, quando começou a sujar as mãos na graxa e penetrar nos corações dos motores e na estrutura interna dos caminhões.
Até os dezoito anos ficou lá. Ele era um jovem inquieto que só conhecia Camboriú e Itajaí (SC), além do percurso entre as duas cidades. Queria conhecer mais, conhecer outras cidades, descobrir o mundo.
Alimentando esse desejo foi servir, ficando no Exército durante um ano. Ser recruta foi importante para ele. Mesmo sem grandes regalias dentro do lar, ele viu que lá fora era mais difícil. Tinha que lavar sua roupa, arrumar sua cama, cuidar das suas coisas e, mais que nada, aprendeu a respeitar a autoridade, a hierarquia.
Depois dessa etapa, voltou um tempo para a oficina, algo em torno de seis meses. Quando saiu de lá comprou um caminhão e se dedicou a transportar paralelepípedo de Camboriú para Itajaí. Até que resolveu entrar para a “faculdade da vida”, viajando pelo Brasil (São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, etc.), cruzando as estradas, um pouco diferentes das de hoje e realizando o desejo de conhecer outros lugares, outras pessoas.
Entre 1961 e 1964 trilhou as estradas do país, levando arroz e trazendo açúcar, num constante ir e vir.
Finalmente, resolveu aportar novamente em Camboriú. Voltou para a oficina. Com o tempo acabou comprando o negócio. Primeiro a metade e depois o restante. O pai era seu avalista, pois era um comerciante muito respeitado na cidade. Bastou sua palavra para o filho conseguir financiar e adquirir oficina.
Assim chegamos ao ano de 1966. Nascia a Oficina do Kiko, começando sua caminhada rumo ao futuro.
A oficina tinha tudo para dar certo. Era a única da cidade e, naqueles tempos, não tinha sido construída ainda a BR-101. Todo o trânsito, para o Norte ou para o Sul, passava pelo Centro de Camboriú. O caminho era muito ruim. Muitos veículos, principalmente caminhões quebravam, estragavam, ficavam no meio do caminho, entre Itapema e Camboriú.
A Kiko Oficina prestava auxílio para aqueles que ficavam na estrada e, também para o pessoal da cidade ou que estava de passagem. Os veículos que ele mais consertava eram caminhões.
No começo Alcy era patrão e único funcionário da empresa. Tempo depois arrumou um ajudante e, com o passar dos anos, foi aumentando seu quadro de colaboradores. Uma das facilidades que agradava aos clientes era que atendia a qualquer hora do dia, prestando um serviço eficiente e que satisfazia plenamente.
Quinze anos depois dos primeiros olhares e namoricos, Alcy e Ecléa casaram e foram morar numa casa alugada. Ela era professora e, há muitos anos, estava de olho naquele mecânico.
Casaram no mesmo ano que o trecho da BR-101 foi inaugurado em Santa Catarina. O movimento de veículos, principalmente caminhões, migrou do Morro do Encano e de Camboriú, para a nova rodovia, asfaltada e reta, facilitando a circulação e o transporte de cargas.
A economia da cidade foi um pouco afetada, mas não muito afirma Alcy. Ele continuava sendo o dono da única oficina mecânica da cidade e sempre tinha clientes. Pouco a pouco, começaram a aparecer veículos menores, carros que ele consertava com mais prazer, pois passou um período muito longo sozinho, sem ajudantes. Era muito mais fácil e leve consertar um carro. Já um caminhão ou ônibus exigia mais esforço e mais força física.
Dois anos depois de casar, ele se sentiu pronto para comprar a casa que alugava. Conversou com o dono e ficou sabendo que tinha pouco mais do que a metade do valor da casa. Fizeram um acordo de cavalheiros. Ele entregou o dinheiro que tinha e ficou de ir pagando em prestações. Mensalmente, o dono passava por ali, tomava uma cerveja ou duas com Alcy, conversavam e acertavam o valor da prestação. Assinavam um recibo feito num guardanapo de papel e a vida continuava. Assim, ele acabou de pagar a casa, ao mesmo tempo em que desenvolvia lentamente a oficina.
O local onde funcionava a oficina, ainda era de madeira e com piso de terra. Com o passar do tempo ele foi melhorando o espaço. O terreno não era dele. Acertou com o proprietário que ficaria ali sem pagar o aluguel por seis meses, depois compraria o mesmo. Tempo depois apareceu o sogro daquele homem que tinha feito o acerto com ele, afirmando que era o verdadeiro dono e que queria receber o aluguel de todos aqueles meses. Alcy não aceitou as novas condições, pois não era o que tinha tratado com o genro do homem. Acertaram que, no máximo em dois meses, a oficina sairia do terreno. Antes de acabar o prazo, Alcy negociou com outro proprietário e mudou o seu local de trabalho para o outro lado da rua.
Quando passou o primeiro ano, ele foi negociar com o dono, com a intenção de comprar o terreno. Ele não tinha o valor pretendido por aquele pedaço de terra. Voltou no ano seguinte e descobriu que o preço tinha aumentando em torno de 50%. Voltou para casa, analisou a situação, ponderou que já tinha feito algumas melhorias no local e que, talvez, quando voltasse no ano seguinte o preço poderia dobrar. Deu um jeito e acabou comprando o terreno, pagando aos poucos e dando o endereço definitivo para a Kiko Oficina.
Naquela metade final do século XX, as peças para consertar veículos só se encontravam em Itajaí. Para retificar um motor o local mais próximo era Blumenau. Alcy vislumbrou uma oportunidade de negócio. Cada vez que precisava de uma peça, para algum veículo, em vez de comprar uma, comprava dez ou mais. Tinha um quartinho onde guardava as peças que comprava a mais. Aos poucos formou um estoque. Com a chegada dos viajantes, naquela época a empresa mais forte que o visitava era a Hermes Macedo, começou a comprar em quantidade as peças e acabou abrindo a loja, na própria oficina e que inicialmente foi administrada pelo filho maior, Emiliano.
Alcy Pereira teve uma passagem pela política local, no inicio da década de 70, no século passado. Seu bisavô, Manuel Anastácio já tinha sido o primeiro prefeito da cidade de Camboriú. Outros familiares ocuparam cargos tanto no Executivo municipal como no Legislativo. Ele afirma, com convicção, que o melhor prefeito que a cidade teve foi seu irmão Andrônico, cem anos depois do bisavô ocupar o mesmo cargo.
O popular Kiko não tem boas lembranças da época que esteve vereador. Ele era oposição. Ele e outro vereador eram filiados ao MDB, partido da oposição, que tinha que enfrentar cinco vereadores da ARENA. Era sempre voto vencido. A situação comandava a festa.
O grande debate da época aconteceu com o projeto de tratamento da água, vindo do governo estadual. Alcy insistia que o mesmo deveria ser realizado em Camboriú e não em Balneário Camboriú, como estava sendo apresentado. Ele não entendia como a água, sendo da cidade, deveria ir para outro município para ser tratada e voltar devendo ser pago um valor alto por esse tratamento. O voto dele acabou sendo derrotado. O tratamento ficou com Balneário Camboriú e, ciclicamente, a discussão retorna, principalmente quando falta água na cidade ou se percebe o alto custo pago pelo tratamento. Alcy tinha razão, mas foi voto vencido. Ele atuou no Legislativo municipal de 1970 a 1973.
Em determinado estágio da sua vida, Alcy começou a pensar naquele filho que tomaria seu lugar e levaria a empresa adiante.
Emiliano, formado em Comércio Exterior, estava pronto para outros voos, Janini, PHD em Oceanografia morava e trabalhava na Bahia e Adriano, o filho caçula, estava apaixonado pela Biotecnologia, além de cursar a Licenciatura em Letras (português/inglês) com o objetivo de aprimorar seus conhecimentos nas duas línguas. Finalmente, depois de muita conversa, Adriano optou por se formar em Administração e terminou assumindo o controle da empresa, que mudou de nome e passou a ser conhecida com Kiko Peças e Oficina.
Alcy consegue se olhar num espelho imaginário e afirmar que sempre foi um homem fiel aos seus princípios. Ético, honesto, sério, sempre preocupado com a família, com um amor enorme pelos filhos, um bom pai que está sempre pendente dos seus e que quer o melhor para eles.
Ele alimenta um grande respeito pelos seus clientes, razão e motivo da existência da empresa. Servir, atender, ajudar a resolver os problemas, tratar com muito carinho os clientes e resolver seus problemas é o objetivo, a missão dele e da empresa.
Alcy Pereira tem planos simples para o futuro. Sabe que a empresa está em boas mãos e que vai continuar crescendo e se fortalecendo. Agora pensa em trabalhar menos, deixando Adriano levar o barco adiante, quer viajar com sua esposa, conhecer novos lugares, visitar sua filha na Bahia, desfrutar um pouco da vida.
Ele lutou a boa batalha e venceu. Ainda tem muito caminho pela frente e enfrenta o futuro com um sorriso no rosto, como sempre fez na sua vida, minimizando dificuldades e focando nas soluções.
Adriano Pereira, o filho caçula que o sucedeu, se considera um cidadão legítimo de Camboriú, mesmo tendo nascido em Itajaí, pois não havia um hospital com maternidade na cidade.
Sua infância foi similar à do pai, muitas décadas depois. Ele também cresceu num ambiente tranquilo, com liberdade e segurança. As amizades que fez na sua infância e adolescência, no colégio ou na vizinhança, ele conserva até hoje.
Brincou também em “zorras” como seu pai e se inclinou por esportes individuais, principalmente por lutas.
No colégio sempre teve boas notas e se inclinava pelas Ciências Exatas, principalmente Matemática, tirando sempre notas excelentes.
Sempre se relacionou bem com colegas e professores. Lembra com carinho o nome de todas suas professoras desde 1ª até a 4ª Série na Escola Professor José Arantes. Depois foi estudar em Itajaí e dali partiu para Florianópolis, onde se formou como Técnico em Edificações.
Adriano não parou de estudar. Acreditava que seu caminho estava em outro lugar. Iniciou seus estudos em Biotecnologia e, ao mesmo tempo, cursou Licenciatura em Letras, as duas opções na Univali. Mas, a pressão familiar era para que ele assumisse o timão da empresa. Assim, começou a cursar Administração, formando-se e deixando de lado as outras duas opções.
A sua chegada definitiva na empresa, em realidade ele estava presente nela desde 1996, passando por todos os setores, começando como mecânico, trouxe um ar de inovação e modernidade para a Kiko Peças. Com o conhecimento técnico, a preparação universitária, a intimidade com os mínimos detalhes da oficina, a capacidade de dialogar, agindo com respeito e coerência, as melhorias começaram a aparecer.
No começo não foi muito fácil. Alguns procedimentos estavam enraizados na empresa, alguns hábitos eram difíceis de serem erradicados ou mudados. Com muita paciência, principalmente para não desrespeitar o pai nem ferir sua autoridade, ele foi alcançando seus objetivos.
Com seu pai sempre teve uma relação muito boa, com algum período curto de rebeldia, quando era adolescente. Ao falar dele se emociona, chegando às lágrimas. Alcy é seu exemplo de vida. Adriano comenta que seu pai lhe ensinou tudo dando o exemplo. Ele soube qual era o caminho certo vendo como atuava seu pai. Nele sempre encontrou apoio e existe entre os dois uma conexão muito intensa, carinhosa e sincera. As pessoas que olham de fora percebem isso. A presença paterna é muito importante para o homem que hoje comanda a empresa. Ele comenta que só pelo fato dele chegar por ali e ficar olhando ou comentando alguma coisa já é muito gratificante. Ter a sua presença é muito bom.
A transição, da administração de Alcy para o comando de Adriano, foi lenta e paciente. Pelo caminho surgiram, como em todo negócio, algumas dificuldades. Adriano é uma pessoa muito estudiosa, gosta de se aprofundar nos assuntos, nos diferentes procedimentos da empresa.
Ele participa de um Núcleo de Oficinas de Balneário Camboriú e Camboriú. O intuito é trocar informações, conferir novidades, encontrar soluções a problemas comuns a todos. Adriano afirma que é uma experiência muito importante e gratificante.
O filho caçula de Alcy procura estar sempre informado. Mesmo não mexendo diretamente na parte mecânica, se mantém atualizado. Está sempre procurando novos equipamentos, novos procedimentos, novidades que podem ajudar a resolver problemas ou a qualificar mais os colaboradores e a própria empresa.
Ele está enxergando longe. Pretende aumentar o leque de serviços da Kiko Peças. Além da parte referente à mecânica e a venda de peças, há planos para vender pneus, abrir um setor exclusivo para alinhamento e geometria, repaginação de toda a loja, compra de novos equipamentos e atuação intensa nas mídias sociais, para atingir os mais jovens que não conseguem ficar longe da internet, que não conseguem viver se não estão conectados.
Adriano Pereira, o sucessor de Alcy, é casado com Janaína Madeira Bastos e pai de dois filhos. Alef Pereira, de dezessete anos e que, curiosamente, está no mesmo curso que ele fez no passado, no IFC, preparando-se para ser Técnico em Edificações. Esse é seu primeiro passo, pois pretende ser arquiteto ou engenheiro civil. O outro filho, Alonso Valentino Bastos Pereira, tem nove anos e está no colégio.
Mesmo jovem e com muito terreno pela frente, Adriano já está pensando em quem vai ser seu sucessor. Ele tem muita confiança no crescimento da empresa. Tem uma certeza: nada fica estático, tudo vai se transformando, tudo vai se modificando.
Por esse motivo está sempre estudando, sempre procurando informações, novidades. Não quer parar no tempo, não quer ser deixando para trás.
Quando ele assumiu a direção da empresa, algumas coisas eram diferentes. Ele lembra, por exemplo, que tinha num canto uma montanha de peças velhas, que eram jogadas ali pelos funcionários. Às vezes alguém vinha e procurava ali uma peça. Aquilo incomodava muito ao administrador consciente e organizado que é Adriano. Com paciência, conseguiu convencer aos outros que aquilo tinha que estar organizado, que não podia continuar aquele monte de peças ali. Conseguiu organizar, pouco a pouco, o espaço de trabalho.
Alcy, quando comenta sobre a administração do filho, não esconde o orgulho e o prazer de ver como ele atua. Tem consciência clara de que o salto de qualidade dado pela empresa, o crescimento que salta aos olhos, a organização e as perspectivas de futuro, só aconteceram pelo trabalho dedicado de Adriano. Ele fala, sem temor, que nas mãos do filho a empresa está na direção certa. Que ele mesmo, apesar de ser o patriarca da família, não teria condições de fazer o que o filho fez e está fazendo. Uma atitude digna e generosa de parte do pai, revelando o amor e admiração que sente pelo filho.
Eclea Maria Pereira, a mãe, fica sem palavras quando comenta sobre seu filho menor. Sente orgulho dele e isso é visível nas suas palavras, nos seus gestos, quando está comentando algo sobre Adriano. Vê nele um homem tranquilo, paciente, muito competente, muito bom, que resolve as coisas com tranquilidade e sem se amarrar, com muita atitude. Não vê grandes problemas na oficina, mas isso se deve principalmente à administração de Adriano.
Ecléa, muito mais que o marido, quer desfrutar do que construíram. Quer viajar, conhecer lugares diferentes, visitar sua filha, andar um pouco pelo mundo. Ela se encarrega de escolher os lugares e os roteiros e, afirma com segurança, que Alcy é um ótimo companheiro de viagem.
Conversar com Alcy, agora que a vida começou a dar uma folga para o trabalhador de sempre, se transforma em um momento de aprendizado e de contemplação. Alguém que já atravessou mais da metade do século passado e um bom pedaço deste, e mantém o sorriso tranquilo no rosto, afirmando que nunca teve grandes dificuldades para solucionar problemas, para encontrar o caminho e construir uma vida plena de conquistas, é sem dúvidas alguém que deve ser ouvido com muita atenção.
Todos têm muito a aprender com ele sobre como se constrói uma empresa, um lar, sobre como se faz para manter uma família unida num mundo turbulento. Um mundo no qual cada vez mais se perdem valores e se respeita menos o próximo, apesar de leis, promessas e palavras.
É uma história que vem de longe, talvez muito antes do bisavô que foi o primeiro prefeito da cidade. Alcy foi abrindo caminho, desbravando, calçando a trilha, preparando o espaço para Adriano. Mas alguém, o próprio pai de Alcy, fez sua parte quando o filho precisou de apoio e direção.
A cidade cresceu. Perdeu seu ar bucólico, a família também cresceu para todos os lados. O que não se perdeu, no maremoto do progresso, no turbilhão do crescimento, foi o sentimento de união que corre pelas veias da família. Os valores que foram plantados no passado não tão remoto e que permanecem intactos no coração da nova geração, representada por Adriano, o homem encarregado de levar adiante a empresa, respeitando aqueles predicados que a fizeram forte. Não se trata somente de uma empresa, se trata de algo mais profundo que muitas vezes não se pode explicar com simples palavras.
A vida não passou em vão para Alcy Pereira. Ele soube e sabe o que fazer com o seu tempo. Isso tem um nome: sabedoria.